Wednesday, February 20, 2013

Laranja Digital


Às vezes gosto de começar meus textos com uma confissão. Minha confissão do dia é que não enviei um único cartão de Natal neste ano.

Só recebi uns três, um deles com um cartãozinho contendo um desenho de um pato, que compensou a falta quantitativa de cartões.

Tenho um pouco de saudades da época em que as pessoas demonstravam às outras que valiam pelo menos o preço de um selo e de um cartão. Convenhamos, num ano inteiro é uma barganha.

De fato, quando o orkut, facebook, myspace e companhia limitada viraram moda, quase todo mundo enviava mensagens de Natal e Ano Novo. Hoje em dia, raras são até as mensagens individuais dos sites de relacionamento. Quando muito você recebe um recado grupal, se tiver sorte de estar na lista.

Lembro-me de uma gráfica, na qual imprimia a Brazilian Yellow Pages, que me enviava não um cartão, mas sim uma caixa de deliciosas e rechonchudas laranjas todo ano. Nem cristãos eles eram, e sim, chineses. Tinha um cliente, um multibilionário banco, que me enviava uma garrafa de Johnny Walker. Um outro cliente, uma empresa de traduções, me mandava um presente religiosamente. Num ano um inesquecível sortimento de geleias.

Não é preciso dizer que presentes corporativos também caíram no desuso. Notem bem, nos últimos anos fiz um volume de negócios muitas vezes superior ao que fazia com a gráfica dos chineses com diversas empresas. Dessas nem cartão recebi. Imagino que para merecer um presentinho hoje em dia é necessário fazer milhões de dólares de negócios.

Ok, sei que estamos em crise. Mas o problema não é de hoje, precede a crise.

A verdade é que estamos ficando cada vez mais egoístas. Incluo-me nesse rol.

A tecnologia matou diversas coisas gostosas, além dos cartões de boas festas. Por exemplo, comprar um disco era uma aventura.  Você literalmente ia à loja para ver as novidades, às vezes pedia para ouvir o disco e se gostasse, levava. Quando apareceram os CDs a coisa já ficou meio sem graça. Um LP era um evento, cheio de encartes, fotos e desenhos grandes. Os CDs, com letras minúsculas, já tirou boa parte do prazer de consumir música. Hoje, compra-se arquivos de mp3 na amazon.com ou qualquer outra e-store do tipo, e as próprias lojas de CDs estão desaparecendo. Está acabando a graça de consumir música, pura e simplesmente.

Agora querem fazer a mesma coisa com os livros. Se for pelo mesmo caminho da música, que se cuidem os escritores.

E com isso se vão duas excelentes opções de presentes.

Resta-me um consolo. Acho impossível criar uma laranja digital.

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